Proteção Penal aos Interesses Sociais Aula 04 28-08-18

Fases do crime. Inter Criminis
Isso é necessário para entender o conceito de tipo autônomo.
A primeira fase do crime é a cogitação. A cogitação consiste em um ato impróprio. Isto quer dizer que um mero fato, uma mera circunstância de se cogitar, não necessariamente vai se desdobrar em uma conduta concreta.
A cogitação se concretiza pelos atos preparatórios. Os atos preparatórios, ao contrário da cogitação, são atos próprios, pois são atos de realização. Assim como a mera cogitação os atos preparatórios são impuníveis, enquanto limitados a atos preparatórios. Ao contrário da cogitação que sempre é impunível.
Os atos preparatórios são impuníveis somente enquanto limitados a meros atos preparatórios, pois se considerados em si mesmos, ele pode constituir crime. O agente adquire uma arma com a proposta de praticar crime de homicídio. Ele já passou pela cogitação e foi para ato de preparo. Se ele adquiriu a arma de forma licita, esse ato é impunível. Mas se ele adquiriu a arma de forma ilícita é um ato punível pois se trata de porte ilegal de arma.
obs: a doutrina chama isso de teoria do recorte. É quando o ato preparatório já constitui algum outro tipo penal, como no caso do porte de arma em relação ao homicídio.
ato impróprio = cogitação, sem ato concreto
ato preparatório e execução tem atos concretos. Aí são atos próprios.
Atos próprios de execução são aqueles que ocorrem após os atos preparatórios. Ao se ingressar nos atos de execução, começa a realização do inter criminis. o percurso que o agente vai perseguir, a intenção que o agente vai perseguir que o agente vai até conseguir o resultado. Enquanto que a satisfação plena do crime que esta além do mero resultado representa o exaurimento do crime.
Alguns crimes por sua própria natureza ou condição formal não exigem este percurso. São crimes que não necessitam percorrer os passos. São crimes que se realizam com o próprio verbo. Por exemplo o crime de ameaça, tipicamente formal.

Art. 147 – Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave:

Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.

A natureza formal desses crimes tornam esses crimes incompatíveis com a figura da tentativa. A tentativa é a interrupção involuntária do inter criminis. Pois se essa interrupção for voluntária temos outra figura, a desistência voluntária, um ato interno do agente, depende da autonomia da vontade.
A tentativa pode até implicar em uma desistência, mas são fatores externos, alheios a vontade do agente. Eu queria mas não consegui. Na desistência eu posso mas não quero.
o legislador de uma forma geral criou alguns tipos penais que se considera como sendo de perigo abstrato, que são crimes que colocam em risco um potencial lesivo, um risco a um bem jurídico em regra um bem que tutela coletividade. Como os crimes de perigo comum, que pode ir além do risco desejado. O Agente não quer que o resultado vá além daquilo, mas a conduta por si só gera perigo comum. incêndio, explosão, ele não exige a produção de um resultado que demonstre o perigo comum.  A existência de um resultado agrava ou qualifica o crime. Os crimes contra a saúde publica, os crimes contra a economia popular. A vitima é a coletividade. Consequentemente o perigo em relação aos crimes é abstrato, é presumido.
Em relação a estes crimes o legislador trouxe duas classificações possíveis. Primeiro são os crimes acessórios ou parasitários. Doutrinadores querem impor, estabelecer sua doutrina. E assim ele pega algo que todos chamam de um determinado nome e inventa um nome especifico. Tentativa branca. Figura especifica do crime de homicídio que não resulta em lesões. Realizo 5 disparos e não acerto nenhum. Tentativa vermelha é quando ocorreu o resultado da lesão.
Assim se utiliza essa expressão que é específica para outros conceitos.
Ponte de ouro é a desistência voluntária sem resultado… tem a ponte de prata que é a desistência voluntária mas quando já tem algum resultado…
obs:

Pontes de ouro (de acordo com clássica lição de Von Liszt, que tem a paternidade do direito penal moderno) são institutos penais que, após o início da execução de um crime visam a eliminar a responsabilidade penal do agente, estimulando-o a evitar a consumação. São dessa natureza tanto a desistência voluntária (o agente inicia a execução do crime, pode prosseguir, mas resolve desistir) como o arrependimento eficaz (o agente esgota os atos executivos, se arrepende e pratica uma conduta voluntária de salvamento do bem jurídico). Ambos estão previstos no art. 15 do CP. O agente, nesse caso, se iniciou a execução de um crime de homicídio, não responde pela tentativa deste crime, sim, apenas pelo que objetivamente praticou (lesão corporal).

Pontes de prata são institutos penais que, após a consumação do crime, pretendem suavizar ou diminuir a responsabilidade penal do agente. É dessa natureza, por exemplo, o art. 16 do CP, que cuida do arrependimento posterior; o agente consuma o crime não violento e depois repara os danos ou restitui a coisa, antes do recebimento da ação penal.

Mas para os chamados crimes acessórios criaram a expressão crime parasitário.
Crime acessório é um crime cuja existência depende de um crime antecedente. O crime acessório por si só é atípico. O crime acessório depende de um crime antecedente. O crime de receptação. 180 CP.
Assim deve existir um crime anterior e o agente precisa saber que  a coisa é proveniente disso.
O legislador deve saber que alguns crimes muito embora dependam da existência de um crime antecedente, o legislador trouxe uma autonomia dos tipos penais. Ou seja, entre esses crimes não há uma relação acessória. Há uma relação de dependência indireta ou reflexa.
Mas essa relação de dependência não afasta a autonomia do tipo. Pois o bem juridicamente tutelado pelos tipos penais embora por condutas distintas tutelam o mesmo bem jurídico de caráter difuso.
São condutas diversas, o dolo é distinto. O fim não é o mesmo, ainda que as condutas sejam semelhantes. São tipos autônomos. Onde está essa autonomia, na distinção do dolo e na utilidade específica. O trafico e uso de drogas por exemplo. Uma conduta depende da outra. Os verbos podem ser os mesmos, mas o bem juridicamente tutelado é coletivo, a saúde pública, bem de perigo abstrato que não depende da ocorrência de resultado.
O crime de receptação ocorre quando o objeto é produto de um crime, mesmo que o autor do crime seja desconhecido.
Uma reprodução xerográfica não autorizada. A pessoa que recebe a copia não é receptador, mas sim concorreu com o crime, pois o núcleo do verbo é violar e ambos violaram.
Petrechos

Petrechos de falsificação

Art. 294 – Fabricar, adquirir, fornecer, possuir ou guardar objeto especialmente destinado à falsificação de qualquer dos papéis referidos no artigo anterior:

Pena – reclusão, de um a três anos, e multa.

Petrechos para falsificação de moeda

Art. 291 – Fabricar, adquirir, fornecer, a título oneroso ou gratuito, possuir ou guardar maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de moeda:

Pena – reclusão, de dois a seis anos, e multa.

O legislador quis aqui tratar da autonomia entre os tipos penais, da mesma forma que pune a falsificação, o ato de falsificar, e ate mesmo o uso por equivalência das mesmas penas atribuídas ao falso aquele que usa, como se ele mesmo falsificasse. Quem falsifica não pode responder pelo posterior uso.
Considerando o perigo abstrato, o legislador de forma autônoma deu tipicidade a quem de qualquer forma possui petrechos destinados a falsificação.
Aqui deve ser feita uma distinção: especialmente destinados a falsificação. Posse de petrechos impróprios não demonstrada a sua utilização habitual a realização do falso é comportamento atípico.
Uma maquina de xerox, uma gráfica, não demonstrado o caráter de uso permanente, mesmo que sirva para a falsificação mas isso ocorreu esporadicamente, o fato é atípico. Usar o termo “especialmente” somente alcança os petrechos impróprios quando houver a demonstração de permanência daqueles petrechos, que por si considerados não constituem crime.
110000351657 – PENAL – PETRECHOS PARA A FABRICAÇÃO DE MOEDA FALSA ( CÓDIGO PENAL, ARTIGO 291 ) – POSSE DE COMPUTADOR, SCANNER E IMPRESSORA, NÃO DESTINADOS, ESPECIALMENTE, À FABRICAÇÃO DE MOEDA – IMAGEM VIRTUAL DE MOEDA VERDADEIRA – ATICIPIDADE – Constitui crime a posse de petrechos especialmente destinados à fabricação de moeda falsa ( Código Penal, artigo 291 ). Todavia, a posse de computador de mesa, de scanner e de impressora, não destinados, especialmente, à fabricação de moeda, não se subsume à figura típica do referido delito, ainda que, na memória do computador, haja a imagem virtual de uma moeda verdadeira. Interpretação restritiva do artigo 291 do Código Penal , que excepcionalmente tipifica como crime a prática de atos preparatórios. (TRF-4ª R. – ACr 0020684-66.2002.404.7100/RS – 7ª T. – Rel. Des. Fed. Sebastião Ogê Muniz – DJe 31.07.2014 – p. 205)
Alguns autores vencidos: Regis Prado e Vicente Greco Filho. Eles entendem que este crime foi um assodamento, uma pressa, do legislador, com a justificativa de que a mera posse desses petrechos sem a realização do falso seria atípico. Mas esse entendimento é absolutamente isolado e esparso. Este crime implicaria em ato de preparo.
Os petrechos devem ser específicos em relação ao fim para o qual se destina. Papeis de todos os gêneros a exceção da moeda. Selos por exemplo. Selos que dão autenticidade.
O legislador quer proteger a fé pública. O bem juridicamente tutelado é a coletividade. No momento que se fala da fé pública, é a credibilidade que o estado representa. O Estado representa essa credibilidade, não só a esses papeis, mas também a sua moeda. Isso é também a fé pública.
Em relação a esses pretechos. O crime além de autônomo, além de perigo abstrato é crime permanente. Não há a necessidade de que a falsificação venha a ser realizada. O crime está caracterizado com a posse, venda, com o armazenamento desses petrechos.
Existe relação aos petrechos, o que se denomina status garantidor. O agente dispõe de condição legal e legítima para guarda posse ou até mesmo uso destes petrechos, entretanto ele se desvia desta condição legal e dolosamente permite que terceiro se utilize desses petrechos, incorre em crime.
Enquanto revestido desse status garantidor,  posse e até a utilização são atípicos, pois a posse é lícita. A posse se configura a partir de que o agente perde essa condição, por ele mesmo ou em benefício de terceiros para a realização do falso. Forma dolosa. Não há necessidade de que o falso se realize.
Não há a necessidade do lucro faciendi (obtenção de lucro) para o reconhecimento do crime.  O ato pode ser oneroso ou não.
tentativa é possivel em relação a esses crimes?
considerando o crime como formal, a tentativa de adquirir esses petrechos é atípica, pois estaria no campo da cogitação. A tentativa somente seria possível na hipótese do agente estar construindo um petrecho que especificamente se destinará a reprodução do falso.
a aquisição de um scanner, copiadora ou de qualquer objeto semelhante ainda que destinado ao falso, é ato impunível, ainda que iniciada a execução. A efetiva aquisição desses petrechos por si só já configura o crime.
O agente que tenha o petrecho falsifique e coloque em circulação moeda falsa, haverá dois crimes ou um crime único?O crime de fabricar petrecho é absorvido pelo próprio crime de usar o petrecho, que é a fabricação do falso

189073445 – DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL – QUADRILHA OU BANDO ( ART. 288, CP ) – FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS PÚBLICOS ( ART. 297, CP ) – PASSAPORTES – PETRECHOS DE FALSIFICAÇÃO ( ART. 294, CP ) – ANTE – FACTUM IMPUNÍVEL – ART. 59, CP – CORRETA FIXAÇÃO DAS PENAS – REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA – … 3. Aplicação do princípio da consunção quanto ao crime previsto no art. 294, CP , pelo tipo penal previsto no art. 297, CP . Absolvição do réu apenas quanto ao crime de guarda de petrechos de falsificação. Teoria do ante – factum impunível.  (TRF-2ª R. – ACR 99.02.28210-5 – RJ – 5ª T. – Rel. p/o Ac. Juiz Guilherme Calmon Nogueira da Gama – DJU 06.09.2002 – p. 408)

1000605519 – PENAL – CRIMES DE MOEDA FALSA E PETRECHOS PARA FALSIFICAÇÃO – SUBSIDIARIEDADE – ABSORÇÃO – -Materialidade comprovada pela apreensão das cédulas e laudo elaborado. -Autoria do fato devidamente estabelecida no conjunto processual. –O crime do art. 291 do Código Penal é do tipo subsidiário, sendo absorvido pelo do art. 289, caput quando do uso dos petrechos na falsificação das cédulas apreendidas. -Recurso desprovido e sentença reformada de ofício. (TRF-3ª R. – ACR 2001.61.81.000693-0 – (13903) – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Peixoto Junior – DJU 20.08.2004 – p. 365)

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