Proteção Penal ao Indivíduo Aula 5 15-09-2017

Homicídio
Culpabilidade tem relação com discernimento. é um conceito de capacidade. E há dois critérios, um é o critério etário e o outro é clínico. Linha divisória entre 16 e 18 anos. Esse é o conceito de capacidade no direito civil.
Já o direito penal trata a capacidade como imputabilidade, a capacidade para receber pena. Existe a inimputabilidade, que é a impossibilidade de se receber pena. É por isso que temos a semi-imputabilidade, uma relação intermediária, entre a capacidade e incapacidade ( isso esta no parágrafo único do art. 26CP ). O discernimento, a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e poder se dominar, se controlar diante dessa atitude. Assim é entender o que é licito e ilícito (consciência) e a capacidade de poder se controlar no campo da vontade.
Vontade é o dolo. Na imputabilidade não há o que se falar em dolo, pois o agente não tem discernimento.
Inimputáveis
Art. 26. É isento de pena o agente que, por doença mental ou  desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Parágrafo único – A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Assim o discernimento no nosso sistema é tratado pela forma clínica, psíquica e sentimental. A clinica é a condição médica, ou seja, são os “loucos de todo o gênero” ( essa expressão hoje não é politicamente correta e foi abolida do CC, mas se referia a falta de desenvolvimento mental, incompleto ou retardado) isso que o distingue da imputabilidade da semi imputabilidade.
inimputabilidade extingue a pena. Reconhecida a inimputabilidade, a pena é extinta. Inimputabilidade clínica tem que ser via perícia, é o medico que dá. A absolvição imprópria – não recebe pena mas recebe medida de segurança.
Recebe internação ou tratamento ambulatorial.  Isso de acordo com o grau de inimputabilidade.
Pena = punir expiar ressocializar
medida de segurança= detentiva ( internação) ou não detentiva ( tratamento ambulatorial)
o critério para a medida de segurança é a periculosidade – risco à segurança própria ou de terceiros, que necessite ou não da internação.
A medida de segurança não tem função ressocializante, mas sim função terapêutica ou curativa. Não há uma função punitiva. Por esse motivo que enquanto a pena tem tempo de duração, a medida de segurança é indeterminada com relação ao tempo.
E as relações psíquicas? De certa forma se relaciona com a clínica. O que diferencia uma da outra? Discernimento não ausente, mas sim comprometido. Exemplo, um vício. Alcoolismo.
Especificamente em relação ao álcool e drogas, a lei de drogas trata da mesma forma do art. 26 CP:

L11343/06 Art. 45. É isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Parágrafo único. Quando absolver o agente, reconhecendo, por força pericial, que este apresentava, à época do fato previsto neste artigo, as condições referidas no caput deste artigo, poderá determinar o juiz, na sentença, o seu encaminhamento para tratamento médico adequado.

L11343/06 Art. 46. As penas podem ser reduzidas de um terço a dois terços se, por força das circunstâncias previstas no art. 45 desta Lei, o agente não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Uso do álcool ou substância de efeito análogo, sendo este de efeito transitório. Pode agravar a pena, quando é embriaguez premeditada. Mas pode até isentar de pena, quando for involuntária e completa. Poucos são os exemplos que isso pode ter ocorrido.
Abaixo um caso…
152000027711 – APELAÇÃO CRIMINAL – LESÃO CORPORAL LEVE – VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – ART. 129, § 9º, DO CP – EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE PELA EMBRIAGUEZ INVOLUNTÁRIA – ABSOLVIÇÃO – APELO MINISTERIAL – DÚVIDA QUANTO À IMPUTABILIDADE DA ACUSADA – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO – ABSOLVIÇÃO MANTIDA – 1- Havendo dúvida sobre a embriaguez involuntária da acusada e sobre sua capacidade de entender o caráter ilícito de sua conduta ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, a absolvição é medida que se impõe em homenagem ao princípio da presunção de inocência. 2- Recurso conhecido e improvido para manter a absolvição da acusada. (TJPI – ACr 2013.0001.004655-9 – 2ª C.Esp.Crim. – Rel. Des. Erivan Lopes – DJe 25.02.2014 – p. 11)
e quando é de caráter sentimental? Sempre tem relação transitória. Não envolve critério clínico. É meramente sentimental.
há dois ajustes, primeiro um ato ou comportamento de motivação interior, interno. De caráter personalíssimo, que é o amor. Este valor está no elemento subjetivo do injusto. Não é antijuridicidade, pois antijuridicidade não está na tipicidade. Lembrando que crime é fato antijuridico e típico.
o elemento subjetivo do injusto está na tipicidade. O legislador não esta preocupado com sua bolsa…sua vida… o crime não é contra você, mas sim é contra a pessoa ou o patrimônio. A vitima é um personagem. O elemento subjetivo do injusto é aquilo que carrega o valor do bem juridicamente tutelado. Assim o injusto compõe a tipicidade.
e por que é elemento subjetivo e não objetivo do injusto? Pois o código penal não tem norma de proibição ou permissão. A natureza da norma penal é descritiva.. O justo está no não matar.
Subjetivo pois depende de uma interpretação pessoal do valor e de sua relevância. Quanto se interpreta, quanto se dosa, diante desse valor.
valor moral ( caráter personalíssimo) e valor social. O valor moral tem sempre uma motivação pessoal. E o relevante valor social é interpretação coletiva.
Por esse motivo que o privilégio interfere no elemento subjetivo do injusto pois se vincula a uma interpretação. O privilegio nos é apresentado de duas formas. A primeira delas na ausência de qualquer fator que interfira no campo clinico, psíquico, mas que beira sem atingir o valor sentimental.
O agente interpreta que o motivo é relevante para justificar a sua ação. Exemplo clássico, o pai que mata o estuprador da filha. Ele não tem nenhum problema de discernimento. Ele deseja matar o estuprador, há dolo, mas ele acredita que possui justificação para o ato, não enxergava o injusto. O legislador entende isso e diz que pode diminuir a pena..
O autor se vê como vitima e acha que a consequência disso justifica o seu crime.
E o relevante valor social? O agente entende, interpreta que seu comportamento é ato de altruísmo, um bem para a humanidade. Ele acredita que é herói, pois hipoteticamente estaria protegendo não a ele, mas sim a sociedade.
Matar o inimigo público numero 1 da cidade. A vitima não é só ele, mas acredita que a vítima é toda a sociedade. Tropa de elite, Capitão Nascimento se via como herói, torturando, matando, acreditando que aquele ato merecia prêmio… é uma espécie de auto-tutela, fazer justiça com as próprias mãos.
O perigo está no fato de que o valor e a relevância  é interpretada somente pelo próprio agente. Se o pai matar o estuprador da filha, pois não seria na verdade um agravante, pois se trata de motivo torpe (vingança)?
Mas quem avalia isso? O júri.. e o júri não é técnico. Ele pode decidir diferente.
veja o art, 65 e 61 CP
Circunstâncias agravantes
Art. 61 – São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:
I – a reincidência;
II – ter o agente cometido o crime:
a) por motivo fútil ou torpe;
b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime;
c) à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido;
d) com emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum;
e) contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge;
f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica;
g) com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão;
h) contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo ou mulher grávida;
i) quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade;
j) em ocasião de incêndio, naufrágio, inundação ou qualquer calamidade pública, ou de desgraça particular do ofendido;
l) em estado de embriaguez preordenada.
Circunstâncias atenuantes
Art. 65. São circunstâncias que sempre atenuam a pena:
I – ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato, ou maior  de 70 (setenta) anos, na data da sentença;
II – o desconhecimento da lei;
III – ter o agente:
a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral;
b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo  após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as consequências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano;
c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em  cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima;
d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do  crime
e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou.
 
O legislador acrescenta duas figuras sobre o deslocamento da vontade. A vontade inicial do agente não era aquela que se viu no ato do crime, mas sim consequência de uma provocação, unitária ou reinterada, mas de qualquer foma injusta. Entende-se a provocação injusta como aquela que o agente não tenha dado causa.
Cuidado : dentro das atenuantes (cp 65, IIIc) há o ato injusto da vítima: “sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima”, que é diferente da provocação injusta que é privilégio (CP 121 § 1º):“sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima”. Na provocação a vitima provoca a reação e assim o ato do agente é portanto um efeito da provocação. Há um envolvimento sentimental em caráter transitório. Assim não basta que seja um ato de provocação, deve haver  uma violenta emoção no agente, com uma relação de domínio, interferindo o discernimento. Em um caráter meramente transitório, diante de uma relação de imediatividade. Logo após. Consequência imediata. O legislador expressou isso usando o termo “logo em seguida” no caso do privilégio. Assim a injusta provocação tem que ter o ato criminoso imediatamente após, mas no caso do ato injusto não precisa ter esse imediatismo. Veja o julgado abaixo:
137000022916 – APELAÇÃO CRIMINAL – HOMICÍDIO PRIVILEGIADO – REDIMENSIONAMENTO DA PENA-BASE – EXCESSO NA APLICAÇÃO DA PENA – ATENUANTES DA CONFISSÃO E ATUAÇÃO SOB INFLUÊNCIA DE VIOLENTA EMOÇÃO, PROVOCADA POR ATO INJUSTO DA VÍTIMA – IMPOSSIBILIDADE – APLICAÇÃO DO REDUTOR DO HOMICÍDIO PRIVILEGIADO – ATIVIDADE DISCRICIONARIA E FUNDAMENTADA DO JUÍZO SENTENCIANTE.01 No caso em tela, as circunstâncias judiciais foram analisadas acertadamente, entretanto, a exasperação ocorreu de forma excessiva, o que culmina no redimensionamento da pena-base. 02- A confissão qualifi cada, que ocorre quando o agente aduz que agiu sob o manto da excludente de ilicitude da legítima defesa, não conduz ao reconhecimento da atenuante genérica da confissão, prevista no art. 65, inciso III, “d”, do Código Penal .03 A atenuante prevista no art. 65, inciso III, “c” do Código Penal , caracteriza-se enquanto o agente estiver sob a influência de uma violenta emoção, por ato injusto da vítima; Já o privilégio ( art. 121, §1º do CP ) evidencia-se quando através de ação sob o iminente domínio da violenta emoção, constatando-se que este último exige imediatidade, o que se conclui que são institutos diferentes. 04 O quantum de redução do privilégio é tarefa que cabe ao Estado-juiz, que utilizará da discricionariedade fundamentada, atentando para as peculiaridades do caso concreto. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. (TJAL – Ap 0008712-09.2004.8.02.0001 – Rel. Des. Fernando Tourinho de Omena Souza – DJe 24.07.2013 – p. 35)
Essa relação de domínio de maneira a atingir o caráter emocional, possui dois fatores, o chamado dolo de ímpeto, pensem na vida pessoal.. quantos momento já não agimos com uma reação impensada, com esse dolo de ímpeto.. Se eu pensasse não teria agido daquela forma. Fui provocado. A reação é desproporcional.
OBS: o professor não falou, mas o outro fator seria o dolo de propósito, é a vontade livre e consciente que já existia antes da prática da conduta, e que permaneceu durante a prática  e se opõe ao dolo de ímpeto pois nesse caso  a vontade surge no ato e não existia anteriormente.
O legislador trata de proporcionalidade, nas excludentes de ilicitude, o ato de legítima defesa, o estado de necessidade. Existe uma figura, nos crimes contra a honra, de responder uma injúria com outra injúria. Ladrão.. é a sua mãe. Há provocação e retorção de modo proporcional. Mas na injusta provocação há desproporcionalidade, eu respondo uma injúria com um homicídio.
Desproporção não é excesso. A legítima defesa diante do excesso culposo e doloso esta no art. 25 CP
Art. 25 – Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem
O arrependimento é uma consequência natural da violenta emoção. O legislador se utiliza da expressão domínio. O que vem a ser domínio? Tudo o que esta fora de controle. Domínio é o descontrole emocional que interfere no campo do discernimento.
O dolo de ímpeto é um reação. O privilégio não é um direito público subjetivo, mas sim uma possibilidade. O privilégio não afasta a tipicidade. Sendo uma intercorrência na culpabilidade. Por ser mera intercorrência da culpabilidade, não isenta de pena. Não afasta o crime. Mas esses fatores possibilitam a redução da pena
Essa provocação é uma provocação direta e objetiva, onde a vitima concorre para o tipo penal. A vitimologia apresenta pelo menos 20 espécies de vitima.. aqui é uma delas. No artigo 59, o comportamento da vitima entra no critério de dosimetria da pena. E aqui é claro, a vitima concorre para a integralização do tipo penal. Cuidado aqui, não se esta dizendo que a vítima passa com um rolex na rua e quer ser roubada. Não é isso. A vítima quer uma reação, mas não nessa desproporcionalidade. O buling por exemplo, de forma em clara. é uma injusta provocação. Quem pratica buling quer uma reação, deslocando a vontade do agente pela provocação.
Cuidado com o privilegio, ele não é genérico, ele se aplica somente aos artigos que ele expressa o privilégio. Sempre vai estar em algum parágrafo do artigo que tipifica aquele crime.
Não confunda privilegio com o perdão judicial, pois o perdão é causa de isenção de crime e somente se admite nas formas culposas. A natureza jurídica da sentença que concede o perdão é condenatória e não gera efeitos plenos por esta natureza condenatória, como por exemplo, não gera reincidência. O perdão judicial é tratado na dicção de Nélson Hungria, como pena natural. Relação sentimental subjetiva no campo do sofrimento. O agente experimenta pela consequência do crime uma situação que torna a pena desnecessária.
o privilegio e o perdão são situações jurisdicionais  – o juiz dosa a pena, mas é o júri que reconhece o privilégio.

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